O espetáculo mais grotesco do mundo:

resenha do disco “Circo dos Horrores”, da banda PartyGrind

Vinicius Braga
3 min readJun 2, 2021
Arte de capa por Finsternis Design

O atual contexto de ruína do velho Estado brasileiro continua a ser perpetuado por seus exímios defensores, os famigerados agentes do caos que disseminam mentiras deslavadas e contribuem diretamente com o descaso institucional projetado pelo atual fascista que ocupa a presidência e seus asseclas inseparáveis. Conforme já foi mostrado em outras resenhas aqui publicadas, o período sombrio que assola o Brasil (infelizmente) continua servindo para que várias bandas e artistas expressem seu ódio e falta de remorso perante o cenário social e político. Logo, não ousam em poupar palavras para direcionar o sentimento de descontentamento geral.

Um desses projetos é fruto da mente criativa e incansável do jovem multi-instrumentista carioca Igor Goularth, responsável por vários projetos que transitam entre o prog e o black metal. Conhecedor da essência política combativa do grindcore, o músico optou por canalizar toda a sua fúria antifascista em uma one-man band batizada como PartyGrind, que por sua vez, acabou se tornando um dos principais nomes do selo Dead Icon Productions. Após alguns EPs e splits, Igor resolveu apresentar um disco coeso e bem estruturado mesmo se tratando de uma obra da anti-música, cujo objetivo é relatar a podridão reacionária que infesta o país.

Com o singelo título “Circo dos Horrores”, a obra de 10 faixas apresenta um grindcore bruto com elevadas influências de death metal, além de letras contundentes que dissecam o projeto de extermínio empurrado goela abaixo do povo com o auxílio da farsa neoliberal. O disco abre com a veloz “Sangue dos Inocentes”, denunciando em 47 segundos o descaso com a saúde pública, que acaba deixando inúmeras famílias a mercê do abandono. Em seguida, “Desordem & Regresso” e “Idiocracia” apontam o projeto ideológico de “idiotização” coletiva arquitetado pelo atual governo, e instigam o questionamento e a revolta perante tal retrocesso.

Igor Goularth / Imagem do Facebook

“O Quarto Reich” conta com a participação de Fernando Melo e mostra a ascensão do bolsonarismo enquanto ideologia de caráter conservador no seio do povo, enquanto “Sombra do Passado” foca na necessidade de conhecer a própria história para evitar a continuidade dos mesmos erros e tragédias, sobretudo aquelas que são causadas por governos autoritários e perpetuadores de um discurso segregacionista. Na sequência, “Alvo” denuncia a violência urbana enquanto resultado de um projeto genocida cujo principal objetivo é exterminar a parcela menos favorecida da população, citando exemplos reais de assassinados ocorridos no Rio de Janeiro.

“Cidadão de Bem” traça uma breve anatomia do conservador médio brasileiro, cujo fanatismo se baseia em uma moral vazia e hipócrita. Fechando a obra, vemos a trinca de faixas integrada por: “Notícias Falsas”, cuja letra discorre sobre o principal veículo de manipulação utilizado pelo atual governo para enganar e distorcer informações; “Utopia”, lançada como single em 2019 e que relata a falta de perspectivas em um cenário desolador; e por fim, a autoexplicativa “Censura”, que traz a tona as perseguições sofridas por quem ousa opor-se a atual conjuntura e seus principais agentes causadores da desgraça.

Igor executa cada instrumento com maestria, permitindo-se inovar a ponto de incrementar na anti-música suas vastas influências para criar algo único e catártico. Os vocais do músico são ríspidos mas também muito compreensíveis, tornando mais clara a mensagem transmitida ao longo de todo o disco. Mensagem essa que escancara diante de faces e tímpanos o verdadeiro horror de sobreviver no Brasil tomado pelo fascismo, onde o caos e a repressão são as grandes atrações em um cenário violento que, por sua vez, só pode ser alterado através da luta do povo. Reagir e questionar não são opções, mas necessidades intrínsecas ao momento atual.

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Vinicius Braga

Aspirante a jornalista, escritor e vocalista da banda de grindcore Saldo Desigual Moral.